O cinema americano dos anos 80 foi recheado de filmes sobre a guerra do Vietnã. Entre o desconsolo e o “ultra-patriotismo”, a América parecia querer tentar desvelar para si mesma seu trauma pela guerra perdida e tentar entendê-la, talvez entender a si mesma. Contudo, poucos filmes buscaram um mergulho realista, pois quando não eram ufanistas e banais, exaltando o heroísmo dos soldados americanos por trás de uma vilania fabricada do inimigo, buscavam o choque pelo absurdo dentro do absurdo, como na excelente epopéia de Francis Ford Coppola: Apocalypse Now. Mas é em Platoon, de Oliver Stone, que se vai muito além de tudo isso, justamente porque não se vai tão longe.
Lançado em 1986, Platoon trouxe para o cinema talvez a mais verdadeira história de guerra de seu tempo, sem maquiar o conflito e nos jogando para dentro de sua mais franca objetividade: a falta de sentido. Se em Apocalypse Now Coppola já pincelava o absurdo da ausência de sentido com as cores fortes da esquizofrenia da guerra e seu lado mais lisérgico, em Platoon Oliver Stone a revela inteiramente real e desnorteante.
A percepção dessa banalidade bélica é mostrada pela “queda” de Chris (Charlie Sheen), o novato que chega ao pelotão, soldado voluntário de família abastada que larga os estudos para defender seu país. A tal “queda” a que me refiro é uma descida ao inferno, na qual pouco a pouco Chris vai perdendo sua inocência e tomando consciência da realidade da guerra, enquanto seus ideais se esfacelam frente a vivência do combate, através do qual percebe que a verdade vive dentro da completa ausência de verdades.
E quanto mais fundo Chris desce na lama da humanidade, mais se vê como parte dela, chafurdando junto aos companheiros, sem mais distinguir humanos de bestas, sem mais distinguir o certo do errado. Ali o que há é o horror. Horror que se manifesta na violência, no ódio, no abuso e na explosão da bestialidade humana. O que ocorre frente aos olhos de Chris é a desmistificação de qualquer ilusão. É a secura da realidade, da natureza humana e de sua animalidade latente vindo à tona em atos de covardia e sadismo.
O filme conta ainda com atuações marcantes de Willem Dafoe e Tom Berenger como dois sargentos antagônicos em métodos e perspectiva de guerra, além da atuação excelente do próprio Charlie Sheen.
No final, Platoon explica-se naquilo que não tem explicação, justamente por explorar a visão de dentro do combate e do dia-a-dia da guerra, transpondo para o expectador a mesma impressão dos soldados: a de absoluta falta de sentido. Não sem propriedade, já que o próprio Stone, também autor do roteiro, combateu no Vietnã e vivenciou a guerra e sua banalidade animalesca. Em seu filme não nos poupa do horror, mas deixa claro, mesmo sem palavras, mais que o final de Apocalypse Now do Coppola, onde as palavras “o horror, o horror” ressoam no desfecho como síntese da guerra. Em Platoon as palavras finais não dizem, mas o que ouvimos de dentro do filme é também a síntese de qualquer guerra: o vazio, o vazio...
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Platoon
Dir. Oliver Stone
1986/EUA
120 min.
Lançado em 1986, Platoon trouxe para o cinema talvez a mais verdadeira história de guerra de seu tempo, sem maquiar o conflito e nos jogando para dentro de sua mais franca objetividade: a falta de sentido. Se em Apocalypse Now Coppola já pincelava o absurdo da ausência de sentido com as cores fortes da esquizofrenia da guerra e seu lado mais lisérgico, em Platoon Oliver Stone a revela inteiramente real e desnorteante.
A percepção dessa banalidade bélica é mostrada pela “queda” de Chris (Charlie Sheen), o novato que chega ao pelotão, soldado voluntário de família abastada que larga os estudos para defender seu país. A tal “queda” a que me refiro é uma descida ao inferno, na qual pouco a pouco Chris vai perdendo sua inocência e tomando consciência da realidade da guerra, enquanto seus ideais se esfacelam frente a vivência do combate, através do qual percebe que a verdade vive dentro da completa ausência de verdades.
E quanto mais fundo Chris desce na lama da humanidade, mais se vê como parte dela, chafurdando junto aos companheiros, sem mais distinguir humanos de bestas, sem mais distinguir o certo do errado. Ali o que há é o horror. Horror que se manifesta na violência, no ódio, no abuso e na explosão da bestialidade humana. O que ocorre frente aos olhos de Chris é a desmistificação de qualquer ilusão. É a secura da realidade, da natureza humana e de sua animalidade latente vindo à tona em atos de covardia e sadismo.
O filme conta ainda com atuações marcantes de Willem Dafoe e Tom Berenger como dois sargentos antagônicos em métodos e perspectiva de guerra, além da atuação excelente do próprio Charlie Sheen.
No final, Platoon explica-se naquilo que não tem explicação, justamente por explorar a visão de dentro do combate e do dia-a-dia da guerra, transpondo para o expectador a mesma impressão dos soldados: a de absoluta falta de sentido. Não sem propriedade, já que o próprio Stone, também autor do roteiro, combateu no Vietnã e vivenciou a guerra e sua banalidade animalesca. Em seu filme não nos poupa do horror, mas deixa claro, mesmo sem palavras, mais que o final de Apocalypse Now do Coppola, onde as palavras “o horror, o horror” ressoam no desfecho como síntese da guerra. Em Platoon as palavras finais não dizem, mas o que ouvimos de dentro do filme é também a síntese de qualquer guerra: o vazio, o vazio...
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Platoon
Dir. Oliver Stone
1986/EUA
120 min.
2 comentários:
Uma vez lendo Justiceiro, me deparei com uma frase que não faz muito sentido: "se você quer paz, prepare-se para a guerra" é totalmente contraditório, mas parece que o mundo acredita nisso e faz acontecer.
Abraços,
Preciso ver esse filme. Aliás, esse e vários que estão perdidos em minha biblioteca....
Sessão cinema nesse fim de semana....rs
Excelente texto, Roger...
abs
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